Tenho medo de te amar mais do que devia e, embora o amor não devesse obedecer regras e nem devesse possuir deveres, meu medo ainda se manifesta, indevido.
A cada gole de amor que minha alma bebe ao estar ao seu lado, sinto medo de inundar-me da falta completa de medo.
Olhar-te imperfeito me causa medo das minhas imperfeições.
Nossas impermanências me fazem lembrar que nada é plano nesse horizonte de medo e oscilações, lugar cheio de lugares sombrios e escondidos.
Ao lembrar que o amor emancipa a alma, percebo que o que temo seria então, a liberdade. Pergunto-me atônita, por que a liberdade geraria medo? A liberdade que desamarra essas algemas tecidas de lã, nas agulhas cuidadosas do tempo. Essa liberdade que ameaça esse comboio chamado medo.
…
Não temo a morte. Diferente de tanta gente que conheço. Temo apenas que a memória se vá. Temo que a história da minha vida vire um grande borrão de lápis recém apagado numa folha que se amassa aos poucos na rasura de uma borracha ruim.
Talvez por isso eu escreva. Como uma espécie de garantia de permanência, faço da escrita meu rastro. No medo contante de me ver apagada no tempo, as palavras são como marcas no tempo. Embora a genética seja obviamente a forma mais concreta de permanência, é na escrita que sigo exitando, e no tremor de cada palavra, vencendo-me a cada medo.
Eu sentia mais medo antes de você chegar. Com seu olhar seco de realidade foi me trevelando meus próprios segredos.
Na falta de potência no meu medo,
a folha em branco se dobra
me acolhe
Se abre
Sem medo.
O medo tem desistido de ficar entre nós
E, por mais que uns intantes
entre eu e você
já quase não há medo.
Texto de Bárbara Trelha
( Ilustração: Mia Couto em ” A Confissão da Leoa” )